“Oração aos Moços”

“Quando ele já não entende o raio visual pelo horizonte do invisível, quando sua visão tem por limite a do nervo ótico, e que o coração, já esclerótico ou degenescente e saturado nos resíduos de uma vida gasta no mal, apenas oscila mecanicamente no interior do arcaboiço, como pêndula de relógio abandonado, que agita com as derradeiras pancadas os vermes e a poeira da caixa. Dele se retirou a centelha divina. Até ontem lhe banhava ela de luz todos esse espaço, que nos distancia do incomensurável desconhecido, e lançava entre este e nós, uma ´ponte de astros. Agora apagados esses luzeiros, que o inundavam de radiosa claridade, lá se foram, com o extinto cintilar das estrelas, as entre abertas do dia eterno, deixando-nos, tão somente, entre o longínquo mistério daquele termo e o aniquilamento de nossa miséria desamparada, as trevas de outro éter, como esse que se diz encher de escuridão o vago mistério do espaço, entre vós porém moços, que me estais a ler, ainda bilha em todas a sua rutilância o clarão da lâmpada sagrada, ainda arde em toda a sua energia o centro de calor, a que se aquece a essência d’alma e vosso coração, pois, ainda estará incontaminado; e Deus assim o preserve.”

Rui Barbosa
* 05/11/1841
+ 10/03/1923

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